Profissional do Direito se negou a realizar exame para Covid-19, mas insistia em se automedicar com cloroquina e azitromicina
Uma advogada foi condenada a pagar R$ 10 mil a um médico, por ofensa e difamação em rede social. A operadora da Justiça buscou atendimento médico no Hospital Ana Costa em maio de 2020, em de Santos, litoral Paulista, alegando sintomas de Covid-19, mas se recusou a realizar o exame.
A advogada insistia apenas em realizar o uso dos medicamentos cloroquina e azitromicina, os quais denominava o “remédio do presidente”.
Na ocasião o médico recusou a prescrição dos medicamentos, pois não há comprovação científica de eficácia no tratamento da doença e há riscos de efeitos colaterais, incluindo morte súbita.
Com a insistência da paciente em se automedicar, a advogada passou pela avaliação de uma junta de cinco médicos que estavam de plantão no hospital. Todos os profissionais foram enfáticos em não recomendar o uso da cloroquina e azitromicina no tratamento.
Insatisfeita com a negativa, a advogada chamou os médicos de comunistas e publicou, no dia seguinte, na rede social Facebook crítica ao atendimento do médico e insinuação de que os médicos, ao negarem o “remédio do presidente”, contribuíam para as mortes relacionadas ao Covid-19.
A mensagem dizia: “HOSPITAIS PARTICULARES SE RECUSAM A PRESCREVER A HIDROXICLOROQUINA. Com suspeita de covid 19 hoje me dirigi ao HOSPITAL ANA COSTA em Santos e fui atendida pelo (médico e CRM) e após os exames de praxe inclusive eletrocardiograma e ELE ME RECEITOU DIPIRONA e ACETILCISTEINA. Insisti que assinaria o protocolo mas queria usar o remédio do BOLSONARO. AQUI NÃO USAMOS ISSO ENQUANTO NÃO FOR CLINICAMENTE TESTADO. Cheguei à seguinte conclusão: Se onde estou pagando não me receitam, imagine onde devem dar de graça. ASSIM AS PESSOAS CONTINUAM MORRENDO POR NÃO ESTAREM TOMANDO O REMÉDIO CORRETO!”.
A expressão “remédio do presidente” fazia relação ao discurso do presidente Jair Bolsonaro que incentivava do uso da cloroquina e azitromicina no tratamento precoce ou em estágio inicial de Covid-19, mesmo sem comprovação científica de eficácia.
Com relação ao medicamento, o próprio Conselho Federal de Medicina e a OMS (Organização Mundial da Saúde) descartam o uso da hidroxicloroquina e da cloroquina como tratamento da Covid-19.
Para a defesa do médico a publicação, além de ofensiva e com caráter de desinformação, é perigosa. “Além de se sentir ameaçado e coagido em seu ambiente de trabalho, ele viu seu nome lançado de forma leviana em rede social. Neste sentido, teme, inclusive, pela sua integridade física e moral em razão da exposição de seu nome, ressaltando que a publicação está aberta a qualquer pessoa, e não apenas aos amigos da requerida. Tal extremismo político tem levado seguidores de ambas as vertentes a agirem de forma agressiva e ameaçadora”, alegou a defesa.
Na decisão favorável ao médico, o juiz Guilherme de Macedo Soares citou que a advogada estaria se apropriando do “efeito Dunning-Kruger”, um fenômeno que leva indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto a acreditarem saber mais que outros mais bem preparados, fazendo com que tomem decisões erradas e cheguem a resultados indevidos, pois é a sua incompetência que restringe sua capacidade de reconhecer os próprios erros, para reconhecer o direito do profissional da Saúde.
“Em outras palavras, a curva que mostra a relação entre conhecimento de uma área específica e a crença em suas próprias habilidades são inversamente proporcionais. Ou seja: quanto menos uma pessoa domina um assunto, mais ela acredita ter pleno conhecimento sobre ele, a ponto de concluir que sabe até mesmo mais do que pessoas que estudaram a vida inteira a respeito”, relatou o magistrado.
Na decisão que determinou o pagamento da multa de R$ 10 mil por parte da advogada, o juiz ainda afirmou que, “Conforme preconiza o dito popular, de nada adianta explicar a quem está decidido a não entender”