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PF vê indícios de ligação de conselheiro do TCE/MS Osmar Jeronymo com tráfico internacional de drogas

Movimentações financeiras atípicas e enriquecimento suspeito apontam possível prática de lavagem e dinheiro de traficantes

A operação Mineração de Ouro, desdobramento da Lama Asfáltica, apontou um possível envolvimento do conselheiro do TCE/MS (Tribunal de Contas do Estado), Osmar Jeronymo, com o tráfico internacional de drogas. Com a quebra o sigilo fiscal e financeiro dos investigados, a Polícia Federal realizou uma devassa nas movimentações financeiras e encontrou suspeita de financiamento ao tráfico internacional de drogas e lavagem de dinheiro.

Em 2019 Osmar teve um rendimento anual de R$ 3.847.472,76, de acordo com a própria Declaração do Imposto de Renda do conselheiro. O valor levantou suspeita da Polícia Federal, pois deste total, R$ 1,674 milhão seria referente a venda de um imóvel em Campo Grande.

A casa teria sido vendida pelo valor de R$ 2,3 milhão para Adriana Elizabeth e, apesar de ter declarado o recebimento de R$ 1,7 milhão adiantado da compradora, não há depósito ou pagamento oriundo de Adriana nas contas de Osmar. Além disso, não foi registrada contrato de venda em cartório.

Com essa movimentação suspeita, de acordo com a PF, o patrimônio do conselheiro do TCE/MS saltou de R$ 6,6 milhões para R$ 7,8 milhões em um ano. O enriquecimento suspeito alertou as autoridades policiais que analisaram as contas de Osmar nos anos anteriores, o que levou a um possível relacionamento com o megatraficante do Paraguai, Carlinhos Duro, o Carlos Alberto da Silva Duro, apontado como braço-direito do traficante Fernandinho Beira-Mar.

Ainda em 2019, Osmar comprou uma residência em Ponta Porã (MS) de Ademar de Souza e Iracema Barreto de Souza por R$ 500 mil. O casal Ademar e Iracema são mencionados em ação penal que apura crimes de lavagem de dinheiro para traficantes da fronteira.

Meses depois da compra do imóvel em Ponta Porã, Osmar realizou em junho de 2019, uma permuta entre a casa na fronteira com uma casa no bairro Vila Cruzeiro em Campo Grande, pertencente ao traficante Carlinhos Duro. O imóvel da Capital tinha o valor de R$ 400 mil superior ao de Ponta Porã, e Osmar teria pago a Carlinhos a diferença “à vista”, conforme consta nas investigações.

Porém para a PF tudo aponta que as movimentações possam fazer parte de um esquema de lavagem de dinheiro do tráfico, pois não há registros de movimentações financeiras entre Osmar e o casal Ademar e Iracema pela compra do imóvel em Ponta Porã e Carlinhos e a esposa Cledi Duro não estão entre as movimentações financeiras do conselheiro do TCE/MS.

Com isso, a PF afirma na investigação que “conclui-se, a nosso ver, que há fortes suspeitas de ilicitude, como a lavagem de dinheiro, envolvendo Osmar Jeronymo”.

Ainda em 2019 o conselheiro também recebeu R$ 1.892.182,70 de Luciano Verbena entre os dias 08/08/2019 e 16/08/2019 (intervalo de 9 dias), e de R$ 41.278,00 da Hexxa Shows Gestão Artística Eireli, em 21/01/2019. As movimentações não foram mencionadas em suas transações imobiliárias ou em sua declaração de imposto de renda da pessoa física. Luciano e a empresa Hexxa também são citados como possíveis envolvidos com o tráfico internacional de drogas e lavagem de dinheiro.

Na investigação a PF ainda encontrou o montante de R$ 2,99 milhões em transações financeiras consideradas atípicas e suspeitas envolvendo o conselheiro Osmar no ano de 2019, segundo as investigações o valor não teria sido declarado à Receita Federal.

A PF destaca que parte desse valor foi pago por empresas que podem ter atuado apenas como de fachada.  “Além dos fatos relatados, quanto às movimentações citadas na tabela acima, também foi constatado que: –Das 14 pessoas jurídicas citadas, 8 tinham menos de um ano de atividade quando transferiram recursos a Osmar (nome das empresas…); – Das 8 empresas citadas no parágrafo anterior, 03 foram baixadas após efetuarem as transferências para as contas de Osmar Jeronymo (nome das empresas…) – Foram constatadas diversas coincidências de datas nas transferências realizadas pelas empresas listadas na tabela. A título de exemplo, podem ser apresentadas duas situações: 7 das 14 pessoas jurídicas transferiram recursos para Osmar Jeronymo no dia 21/01/2019 e 4 empresas distintas enviaram dinheiro em 29/01/2019. – 10 das 14 empresas relacionadas na tabela 53 possuem sócios que não apresentaram declaração de imposto de renda pessoa física no ano-calendário 2019, período em que foram efetuadas as transferências para as contas bancárias de Osmar Jeronymo. Ressalta-se que existem sócios que jamais apresentaram DIRPF. Além disso, foi identificada situação em que o único sócio/dirigente/responsável legal está com CPF suspenso (por pendência na regularização). Em outros casos, acionistas constam/constaram como beneficiários do Bolsa Família e/ou do auxílio emergencial do governo federal, instituído pela Lei de nº 13.982/2020 (esta situação será apresentada com mais detalhes ao longo deste relatório). É importante mencionar que diversos esquemas criminosos destinados à ocultação de bens, direitos ou valores (lavagem de dinheiro) utilizam empresas recém-criadas, com sócios de baixa capacidade financeira, para movimentar vultosos recursos de dinheiro, por um breve período de tempo. Após cumprirem a sua finalidade, as pessoas jurídicas são baixadas. Não pode ser descartada a hipótese de que muitas das empresas listadas na tabela tenham sido criadas com este objetivo”, descreve a PF em investigação.

PF aponta que conselheiros do TCE/MS blindaram ‘organização criminosa’ em fraude bilionária

STJ autorizou a quebra do sigilo bancário e fiscal dos investigados e, para a Polícia, há indícios de lavagem de dinheiro e de valores suspeitos de origem criminosa

A investigação da Polícia Federal que desencadeou na operação Mineração de Ouro, na terça-feira (8), aponta que os conselheiros do TCE/MS (Tribunal de Contas do Estado), Osmar Jeronymo, Ronaldo Chadid e Waldir Neves estavam corrompidos pela suposta organização criminosa chefiada por João Amorim, sócio da Solurb, em contrato bilionário entre a empresa e Prefeitura de Campo Grande para a coleta de lixo e tratamento de resíduos.

Para a PF, os conselheiros realizaram uma “manobra jurídica” para impedir a anulação do contrato suspeito de fraude, corrupção, desvio de dinheiro público e superfaturamento e proteger os empresários de possível condenação na Justiça. Com a quebra do sigilo bancário e fiscal dos conselheiros a PF acredita que há indícios de pagamentos pela “blindagem”.

Após investigação da superintendência da Polícia Federal em Mato Grosso do Sul que apontava possíveis irregularidades no contrato firmado em 2012 entre a Prefeitura e a Solurb, o, na época, prefeito da Capital, Alcides Bernal, publicou em dezembro o decreto n. 13.027/2016 anulando a licitação e o contrato com o consórcio.

Ocorre que em menos de uma semana, no dia 2 de janeiro de 2017, já na gestão do atual prefeito de Campo Grande, Marquinhos Trad, o conselheiro Ronaldo Chadid concedeu liminar determinando a suspensão imediata do decreto e reestabelecendo a continuidade da prestação de serviços, mesmo com as suspeitas de irregularidades. Em sua justificativa, Chadid acolheu o pedido da defesa da empresa que alegava que Bernal havia infringido o direito de defesa e contraditório, pois o decreto teria sido publicado no final do seu mandato.

Seis meses depois, em junho de 2017, o TCE/MS determinou o encerramento e o arquivamento do processo pela “perda do objeto”, com a justificativa que o decreto n. 13.040/2017, assinado por Trad, possibilitou, sem restrições, o restabelecimento do contrato com a Solurb. Para a PF a decisão foi absurda e inconsistente, pois ignorou as constatações da Controladoria-Geral da União e os elementos de prova que resultaram na anulação inicial.

Ocorre que o contrato também era questionado em ação popular desde 2018 na 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos da Comarca de Campo Grande por supostos vícios no edital da licitação, corrupção e superfaturamento e, de acordo com a investigação da Polícia Federal, com a proximidade do julgamento da ação e de uma possível condenação dos empresários ou anulação do contrato (o que veio a acontecer em 2021), os conselheiros do TCE/MS “reabriram”, em 2019, o processo administrativo modificando a própria decisão de arquivamento e freando o ação na Justiça Estadual.

No documento da PF analisado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) e que embasou a ação de ontem, as autoridades policiais descrevem que: “O Conselheiro Ronaldo Chadid confessa que seu voto anterior (que baseou decisão unânime do TCE/MS) nos mesmos autos foi um absurdo jurídico por declarar a perda do objeto do processo em razão do Prefeito Municipal ter cumprido a liminar emitida no mesmo processo. Entendemos que não é possível que todos os Conselheiros do Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul possam ter cometido um erro tão absurdo e grosseiro ao concordar com tal voto, de forma que, somado aos demais elementos colhidos, fica claro, a nosso ver, que os Conselheiros do Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul estão corrompidos pela organização criminosa que detém o controle do consórcio CG SOLURB. (…) decisão coincide com a apresentação das alegações finais na Ação Popular nº 0818122-25.2017.8.12.001 da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande-MS, na qual o Ministério Público se manifestou pelo cumprimento do Decreto Municipal nº 13.027/2016, ou seja, quando o absurdo cometido pelo TCE/MS possivelmente resultaria em decisão judicial de anulação do contrato entre a Prefeitura de Campo Grande e a CG SOLURB, tudo indica que o TCE/MS realizou uma “manobra” para reabrir o processo administrativo em questão, modificar a decisão anterior e evitar que a ação popular fosse julgada procedente, anulando a contratação bilionária do Consórcio CG SOLURB”.

Na operação Mineração de Ouro foram cumpridos mandados de busca e apreensão em 20 endereços em Mato Grosso do Sul e no Distrito Federal. A ação é um um desdobramento das ações da Operação Lama Asfáltica, e foram autorizadas pelo ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), também determinou quebras de sigilo bancário e fiscal de investigados.

Além da busca e apreensão, o STJ determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal de investigados. Para a PF a movimentações financeiras suspeitas, incluindo transações imobiliárias com traficantes. Na operação foram apreendidos mais de R$ 1,6 milhão em notas de real, euros, libras e dólares nos endereços dos envolvidos. Há suspeita ainda de negociação de cargos fantasmas. A reportagem tentou contato com os citados, mas não obteve retorno.