Cabo da Aeronáutica é condenado por desacato a superior após comentários de cunho sexual a tenente

O Conselho Permanente de Justiça para a Aeronáutica em Campo Grande, por unanimidade de votos, condenou o cabo da Aeronáutica pelo crime de desacato a superior (Art. 298 do Código Penal Militar). A sentença, proferida em 18 de fevereiro de 2025, fixou a pena em 01 (um) ano de reclusão, convertida em prisão, mas concedeu a suspensão condicional da pena pelo prazo de 03 (três) anos, sob condições. O caso envolveu comentários inapropriados e de conotação sexual dirigidos a uma Segunda Tenente.
O Ministério Público Militar (MPM) denunciou o cabo por fatos ocorridos em duas ocasiões distintas no ano de 2024.
Em 06 de março de 2024, durante uma Ação da Semana da Mulher em parceria com o Hospital do Amor, o cabo, escalado como motorista para transportar pacientes, teria feito vários comentários inapropriados à tenente que acompanhava as atividades. Ele a teria chamado de “linda”, “a tenente mais simpática”, mesmo após a oficial solicitar que parasse, pois era noiva e estava ficando constrangida. Uma outra tenente testemunhou a situação e o constrangimento da vítima.
Em 05 de junho de 2024, a oficial precisou transportar vacinas para uma Unidade Básica de Saúde e solicitou um motorista da garagem da Base Aérea. O cabo se prontificou e, durante o trajeto, teria novamente feito insinuações e comentários desrespeitosos. A denúncia relata que ele comentou sobre dificuldades no próprio casamento e a convidou para “ir embora com ele”. Diante da recusa da oficial, que afirmou estar com casamento marcado e amar o noivo, o cabo teria dito: “Ah tenente, que pena que seu coração já tem dono”. Em seguida, teria feito um comentário de cunho sexual, afirmando que “a filha deles seria linda, pois ela é bunduda e ele também é bundudo e ia ser uma filha bundudinha”, deixando a oficial estarrecida.
A tenente relatou os fatos à sua comandante, o que deu origem ao Inquérito Policial Militar (IPM) e, posteriormente, à denúncia do MPM. A oficial declarou em juízo que, após os ocorridos, procurava trocar suas escalas de serviço para evitar contato com o acusado e que se sentiu com a dignidade e o decoro ofendidos.
O Conselho Permanente de Justiça para a Aeronáutica, após analisar as provas e ouvir a ofendida, o acusado e as testemunhas, julgou a denúncia procedente.
A Justiça Militar entendeu que a conduta do Cabo Expedito ultrapassou os limites da convivência respeitosa entre subordinado e superior, ferindo o decoro e a dignidade da tenente, além dos preceitos de hierarquia e disciplina. A sentença destacou que as expressões foram de inequívoca conotação sexual, com insinuações diretas acerca do corpo da tenente e convites de teor romântico/íntimo, desmerecendo a função pública da oficial.
De acordo com a sentenca, “O elogio inoportuno, a proposta absurda de fuga e a referência pejorativa ao corpo da oficial demonstram uma atitude que não só desrespeitou a dignidade da ofendida, mas também comprometeu sua autoridade dentro da instituição, numa tentativa de macular sua autoridade e tudo cometido em pleno cumprimento de uma missão institucional nobre (transporte de vacinas)”.
Considerou-se que o comportamento do réu, desde a primeira abordagem, revelou um padrão de desrespeito à figura da mulher militar, aproveitando-se do pouco tempo de carreira militar da oficial para constrangê-la. Mesmo com a negativa do acusado de ter tido a intenção de ofender, o Conselho concluiu que suas ações foram conscientes e voluntárias.
Os julgadores vão além e citam em sua sentenca: “Pode-se indagar: “mas isso foi só um conjunto de elogios”. Não! O comportamento do réu, desde o primeiro fato, presenciado pela Ten ALINE, revela que o conceito histórico do patriarcado ainda habita fortemente no imaginário de muitos homens e até em mulheres. O encarar a mulher como objeto, que deve estar sempre satisfeita por ter “reconhecido” seus predicados físicos, são características de uma sociedade que continua a negar essa realidade de desrespeito e violência contra a mulher. Neste contexto, o réu demonstro que não tinha respeito pelo espaço ocupado por uma mulher: de sua superiora hierárquica, Oficial da Força Aérea e, no momento dos fatos, representante da BACG no cumprimento de uma missão institucional. Basta uma simples exercício intelectivo: e se o réu estivesse diante de um Oficial da FAB, uma figura masculina? Faria as mesmas referências? Obviamente, não.”
A pena base foi fixada no mínimo legal de 01 ano de reclusão, convertida em prisão, conforme o Código Penal Militar. Foi concedida a suspensão condicional da pena (“sursis”) por 03 anos, com as seguintes condições: Proibição de contato (presencial ou virtual) com a ofendida; manutenção de distância mínima de 300 metros da ofendida; proibição de cumprimento de serviço em conjunto com a ofendida e dever de se apresentar trimestralmente em juízo.
O regime prisional inicial, caso as condições do sursis não sejam cumpridas, foi fixado como aberto. O condenado poderá recorrer em liberdade.
O juízo destacou que o caso foi conduzido observando o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça. A Justiça Militar diferenciou o desacato a superior (crime mais grave) do mero desrespeito a superior, entendendo que a conduta do cabo atingiu a integridade moral da oficial de forma significativa.
A condenação reforça a mensagem de que comportamentos desrespeitosos e de conotação sexual contra superiores, especialmente em um contexto que envolve a condição de mulher, não são tolerados nas Forças Armadas.
O cabo recorreu ao Superior Tribunal Militar, no dia 16 de abril, da sentenca com recurso de apelacao.
O Conselho Permanente de Justiça para a Aeronáutica – Auditoria da 9ª CJM (Campo Grande/MS) é formado por quatro oficiais juízes: Major José Ivan Pedroza Bezerra Ribeiro; Capitã Daniele Kuwassaki Valesani; 1º tenente Bernardo Ferreira Mazonave e 2º tenente Jefferson José Santos Conceicao Júnior. O juiz militar federal do caso é Jorge Luiz de Oliveira da Silva.
