
A 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul rejeitou, por unanimidade, o recurso de apelação interposto pela parte ré em uma ação de reintegração de posse movida por um condomínio em Campo Grande. A decisão manteve a sentença que garantiu ao autor o direito de retomar a posse de um bem, após comprovação de violação ocorrida em 2020.
O recurso da parte requerida alegava, em preliminares, que a sentença original foi proferida além do pedido (citra petita), havia cerceamento de defesa e falta de fundamentação. Esses argumentos foram rejeitados pelo colegiado, que considerou o conjunto probatório dos autos suficiente para embasar a decisão.
No mérito, a parte requerida argumentou que o condomínio Residencial Fernando Sabino não teria comprovado a posse anterior do imóvel. Essa alegação também foi rejeitada pelo Tribunal de Justiça, que entendeu que a documentação dos autos permitia inferir que a posse do condomínio autor foi violada apenas no ano de 2020.
Caso
O condomínio busca a reintegração de posse de uma área comum invadida pela moradora, proprietária de um imóvel residencial no local. Conforme a matrícula, a unidade da Requerida possui 200 m² de área privativa e direito a 120,513 m² de área comum. Entretanto, em janeiro de 2021, ela construiu um muro e cercamento, ocupando ilegalmente 174,65 m² da área comum, conforme laudo técnico de um engenheiro civil.
O síndico do residencial notificou-a sobre o excesso, explicando que “todos os terrenos do condomínio seguem o padrão de 10m x 20m e que a invasão violava a convenção do condomínio e o manual do proprietário”. A moradora, no entanto, manteve a ocupação irregular, alegando discordância dos limites estabelecidos, mesmo com a comprovação documental e técnica das demarcações originais.
Decisão
O relator do caso, desembargador Nélio Stábile, destacou que a área em disputa pertence inequivocamente ao condomínio, conforme comprovado pelo croqui do imóvel, que evidencia os limites entre as áreas comuns e privativas; relatório de engenharia, elaborado em 2021 e que atestou a invasão após a instalação de um container e cercas pela ré em agosto de 2020 e a matrícula do imóvel, que confirmou que o terreno é parte da área comum, de uso coletivo.
A requerida alegou que o antigo proprietário do imóvel utilizava o espaço de forma exclusiva desde 2006. No entanto, o Tribunal ressaltou que o uso anterior não configurava posse, mas sim uso permitido, já que o espaço era acessível a todos os condôminos. A violação ocorreu apenas em agosto de 2020, quando a ré isolou a área com grades, restringindo o acesso coletivo. O condomínio agiu rapidamente: em abril de 2021, produziu o relatório técnico e, em junho de 2021, ingressou com a ação judicial.
A defesa da moradora tentou sustentar o direito de usucapião (posse prolongada), mas o Tribunal afastou o argumento. O relator explicou que o “ânimo de dono” (intenção de posse exclusiva) só se materializou em 2020, com o cercamento irregular. Antes disso, o uso do espaço era pacífico e compartilhado, sem contestação do condomínio. “Não há posse mansa e pacífica quando se trata de mero uso permitido a todos”, reforçou o julgado.
A moradora alegou direito de retenção do imóvel por ter realizado “benfeitorias” (art. 1.219 do Código Civil). O Tribunal, porém, classificou as mudanças – como a instalação do container e cercas – como danosas ao condomínio, já que obstruíam a área comum. “Não são benfeitorias úteis ou necessárias, mas intervenções perniciosas”, afirmou o relator. A decisão determinou que a ré remova as estruturas às próprias custas.
A defesa tentou cassar o benefício de assistência judiciária concedido ao condomínio, argumentando que este teria condições financeiras após um contrato de pavimentação asfáltica em 2022. O Tribunal rejeitou a tese, destacando que o contrato era pontual e financiado pelos moradores, não refletindo lucro ou capacidade econômica da entidade condominial.
Embora o pedido de condenação por litigância de má-fé tenha sido afastado, o Tribunal advertiu a moradora que repetir teses já rejeitadas em futuros recursos poderá resultar em sanções processuais. “O duplo grau de jurisdição não é carta branca para insistência em argumentos infundados”, alertou o relator.
O acórdão destacou que a sentença original cumpriu todos os requisitos do art. 651 do CPC, comprovando a posse condominial e a violação recente. A relatoria enfatizou que o condomínio agiu dentro do prazo legal para reivindicar a área, já que o marco inicial da posse hostil foi 2020, e não 2006.
A decisão do Tribunal de Justiça foi unânime, com os desembargadores acompanhando o voto do relator.
TJMS – 0820073-15.2021.8.12.0001