IAB rejeita projeto de lei que obriga advogados a provar origem legal dos honorários
O Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) rejeitou, na quarta-feira (10/4), o projeto de lei 3.787/19, que pretende responsabilizar advogados que receberem, conscientemente, honorários com origem ilícita. De acordo com o parecer aprovado pelo plenário da entidade, a medida contraria os valores da profissão e as garantias constitucionais. “Trata-se de pretensão desproporcional em face à intensa restrição aos direitos fundamentais individuais do sigilo da relação de confiança entre o cliente e o advogado, da ampla defesa, do contraditório, do acesso à justiça e do livre exercício profissional de profissão regulamentada”, aponta a análise.
O PL foi apresentado pela deputada federal Bia Kicis (PL/DF) e visa à alteração de três diferentes legislações: a Lei dos Crimes de Lavagem de Dinheiro, o Código Penal e o Código de Processo Penal. A norma pretende equiparar à receptação qualificada o recebimento de honorários advocatícios e obrigar advogados e escritórios de advocacia a prestarem informações periódicas acerca de suas atividades ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ou outro órgão regulador. Na justificativa, a parlamentar defende que esses profissionais são suscetíveis ao recebimento de dinheiro oriundo de atividades ilícitas, já que seria fato público que muitos réus em ações penais não teriam recursos de outra natureza para custear “vultosos honorários advocatícios”.
O relator do parecer aprovado pelo IAB, Marcelo Almeida Ruivo, apontou que a obrigatoriedade prevista no projeto encontra empecilhos na vida prática: “A almejada prova que passaria a ser exigência da Lei Processual Penal é de difícil ou de impossível realização prática, ainda que os recursos sejam absolutamente lícitos. De modo que restringe injustificadamente o direito de liberdade, viola a presunção de inocência e inverte o ônus probatório que recai sobre quem alega”.
O parecer, apreciado pela Comissão de Direito Penal, afirma que a proposta está em desconformidade com as três dimensões do dever constitucional de proporcionalidade: a adequação, a necessidade e a menor gravidade da medida. Ruivo afirmou que, se o fim pretendido com a proposta é a ampliação da repressão à lavagem de dinheiro, ela viola a primeira dimensão do dever constitucional. “A medida mostra-se inadequada e sem respaldo empírico. A falta de respaldo empírico evidencia-se no fato de os advogados profissionais liberais e os escritórios de advocacia serem presumidos potencialmente capazes de participar de operações de lavagem de dinheiro, sem indicação de fontes sobre a realidade prática”, diz o parecer.
Em segundo lugar, o relator argumenta que a legislação brasileira já entende como infração disciplinar atos contrários à lei praticados por advogados em benefício de clientes ou terceiros. “Entende-se que a medida é desnecessária por já existirem outros meios menos interventivos em direitos fundamentais capazes de atingir o suposto fim pretendido, sem inviabilizar a existência da advocacia e o exercício do direito de defesa”, pontuou Ruivo.
Por fim, segundo o parecer, o projeto não apresenta uma razoabilidade: “Também afigura-se a desproporcionalidade nas intensas restrições aos direitos fundamentais ao sigilo, à ampla defesa e ao contraditório, para atingir a suposta finalidade de prevenção da prática do crime de lavagem de dinheiro”.
O consócio Antonio Vieira Sias, que fez a indicação da análise do tema ao plenário do IAB, afirmou que o projeto de lei é desnecessário e apontou que os advogados não têm como saber se os honorários recebidos têm origem lícita ou não. “Obrigá-los a informar cada recurso recebido é uma quebra de sigilo da advocacia e uma quebra da confiança cliente-advogado”, completou Sias.